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A secura na boca


Faz tanto tempo que não escrevo.
Será que as palavras esqueceram de mim?
Em que momento elas foram saindo devagarinho de dentro do meu coração e dos meus pensamentos?
Percebo que querem habitar outras partes do meu corpo.
A inquietude delas fez a dor existir nos meus ossos. 
Dor nos pés cansados de caminhar com elas por horas e em busca de um litro de lágrima que ficou perdida em meio a chuva torrencial no corpo da Amazônia. 
A secura na boca empobreceu o vocabulário.
Sem ditado, eu renunciei a complexidade dos textos eruditos.
Meia palavra basta.
Sem interesse para ouvir as conversas alheias, a crueza delas expôs todos os hipócritas de cabeça oca, vazia e sem brilho.
As palavras sumiram na escuridão e ficaram quietas.
Voltaram a dormir em mim sem papel, caneta e ilusão.

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