Pular para o conteúdo principal

Caminho

 


E quando as palavras nascem é para fazer companhia à alma humana.Preencher a solidão do pensamento solitário.Fazer entender que não estamos sozinhos no mesmo vagão.

E que quando passamos pelo mundo, podemos sair sim revelando por ai as nossas emoções.

Como se fossem riachos molhando os pés cansados de perder o caminho.

Por mais que na maioria das vezes as pessoas não dêem a mínima para aquilo que mora dentro de cada sorriso ou em cada pranto, mesmo sem dar a menor importância para o que você pensa ou o que você sente, mesmos eles ainda dizendo que todo sentimento demonstrado é fraqueza, sendo assim, siga jorrando pelos cantos. E quem não é fraco nesse mundo?

Os bagaços humanos ficaram tão fortes e se transformaram em heróis de quadrinhos, que esqueceram que no fundo somos uma massa de carne?

Mendigos. E mais fundo, ainda somos pessoas sentadas no mesmo vagão, com a mesma passagem, a mesma cabine, o mesmo acento, a mesma roupa e as mesmas emoções.

Todos gostam de jogar bem na sua cara o seu hálito de derrotado e se vangloriar. E quem não gosta, não é mesmo? Você também gosta de jogar na cara.

Passear por toda a extensão do rosto do outro, mostrar toda a sua dor e ensinamentos, como se isso fosse ser algo mais forte do que a sua própria fraqueza ou a dele. Ë uma doença tentar sermos todos iguais.

A única coisa que nos define é que todo está no mesmo vagão.

Tudo para se deleitar, de fato, como se tivesse sentindo alguma coisa, quando no fundo, somente palavras saem da boca para esvaziar em algum convencimento de que poderia ser algo maior que o que já é. Sendo o que tem, são somente lamentações e um discurso solitário de vencedor covarde.

Aquilo tudo que te odeia,  daquilo tudo que odeia, aquilo tudo que ama, daquilo tudo que te ama, é meio viciante, talvez por isso seja bom, e  não passa de entretenimento para cegar e sair do foco. No final é a mesma etapa que nada dissolve: a mente acompanha por inúmeras vozes que silenciam as bolas de carne, quando as emoções se tornam brandas e devagar começam a observar e absorver detalhes por dentro e por fora. De sutileza em sutileza, o caminho se torna mais silencioso e reconfortante, à medida que conhecemos o que já sabemos o que precisávamos aprender, e isso muda tudo, mesmo sentados no mesmo vagão.

E se, em algum momento, revelar tudo o que está escondido? Esvaziar tudo o que está por dentro e ficar quase sem a emoção que nos moveu? O que fazer depois que todos sentiram e olharam de perto o que mora por dentro? O que fazer com toda essa emoção que está jogada na cara de todos e para todos verem e ouvirem? Como vai continuar sendo a mesma pessoa sabendo que quem te viu também tem outras pessoas dentro de si?

Expor liberta. Quebra e destrói o óbvio.

E aos que tem medo de chorar e dizem não mostrar quem são cuidado. Todos adoecem um dia. Chorar na cama é dormir com a beleza toda noite. Ao despertar sempre pode se banhar em suas emoções. Não ter medo de partilhar os sentimentos renova as emoções. Afinal estamos todos no mesmo vagão, não?

Tudo e toda a história que mora por dentro pede companhia. Grita para ser exposta. Expulsa o hospedeiro na marra. Grita por dentro. Tudo nela se move e troca, descama e esfola e com o passar do tempo nasce algo novo e renovador. Afinal, estamos no mesmo vagão sempre.

Qualquer medida de emoção já é um bom começo para ser vida.


Por, Tatiana Sobreira

 

 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Corpos estranhos

Iniciamos a contagem para menos um dia do ano de 2024. Digitei no Google as primeiras palavras que vieram a minha mente: Corpos estranhos. Eis a definição que aparece de cara:  " Os corpos estranhos são  objetos ingeridos que podem ficar presos no trato digestivo, podendo até mesmo perfurá-lo . Os corpos estranhos podem ser engolidos de maneira acidental ou intencional. Os corpos estranhos podem vir ou não a causar sintomas, dependendo de onde eles ficaram presos." Tem tanta compreenção em uma frase tão direta, crua, nua e até invasiva. Revira por dentro e revela o nosso íntimo. Sempre no início de um novo ano somos impulsionados a continuar, a fazer parte de um corpo estranho que carregamos e moldamos por décadas e que de uma hora para outra nos causa a sensação de que algo ficou preso pelo meio do caminho, subindo e descendo, perfurando a cabeça, estômago, coração, alma e sanidade de todos. Engolimos cada pedacinho, conscientes ou não, desse acidente que teima em querer par

A secura na boca

Faz tanto tempo que não escrevo. Será que as palavras esqueceram de mim? Em que momento elas foram saindo devagarinho de dentro do meu coração e dos meus pensamentos? Percebo que querem habitar outras partes do meu corpo. A inquietude delas fez a dor existir nos meus ossos.  Dor nos pés cansados de caminhar com elas por horas e em busca de um litro de lágrima que ficou perdida em meio a chuva torrencial no corpo da Amazônia.  A secura na boca empobreceu o vocabulário. Sem ditado, eu renunciei a complexidade dos textos eruditos. Meia palavra basta. Sem interesse para ouvir as conversas alheias, a crueza delas expôs todos os hipócritas de cabeça oca, vazia e sem brilho. As palavras sumiram na escuridão e ficaram quietas. Voltaram a dormir em mim sem papel, caneta e ilusão.

Terça parte de nós

      Quem sabe um dia os olhos humanos conseguirão ser os olhos do universo. Talvez consigam olhar mais de perto e sem serem vistos pela multidão de pensamentos bisbilhoteiros. Hoje, o coração estourou o corpo, e arrebentou por dentro o cérebro.  Até esfaceleu, rumo corpo abaixo, de tanta emoção.  Numa grande canhoeira, o cérebro inundou, de dentro e pra fora, um corpo sem comando. Sem obedecer, controlar, sem existir e calcular, transformou-se num corpo que frui para bem distante do medo, sem pressa de esperar, sem pedir, sem acumular, somente indo, existindo, sendo e fazendo. Depois do amor resistiu arduamente. Mas somente, depois do amor. Lá no início dos sentidos, na perenidade, nasceu e fez moradia como companhia da imensidão. Atravessou e olhou de perto o ódio, a loucura e o esquecimento. Preencheu tantos espaços que ficou oco. Foi quando decidiu renascer sem nunca ter morrido. Por Tatiana Sobreira